Clipping - G1 RS - 'Esperança': Por que gesto do pai que adotou filho da ex no RS é tão incomum quanto importante

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O vídeo no qual o corretor de planos de saúde Rodrigo Medina Lopes, de 45 anos, revela a Bruno Carneiro Lopes, de 11 anos, que o nome dele consta como pai na certidão de nascimento do menino comoveu o público nas redes sociais. A principal reação é de admiração por um gesto tão incomum quanto a história da família.

O motivo é bastante compreensível dada a quantidade de pais ausentes e, consequentemente, de mães solo. No Rio Grande do Sul, dos 828.706 nascimentos desde 1º de janeiro de 2016, 36.648 não tiveram o reconhecimento do pai biológico. Isto representa 4,4% do total de registros, segundo o Portal da Transparência da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil).

Ao mesmo tempo, no mesmo período, 1.163 crianças obtiveram o registro de adoção ou reconhecimento de paternidade posterior na certidão de nascimento. É pouco mais de 0,1% do total.

No entanto, no Brasil, a proporção de pais ausentes em relação aos que reconhecem a paternidade é ainda maior. Das 17.169.452 crianças nascidas no período, 933.005 foram registradas só em nome da mãe. Logo, em torno de 5,4% dos nascidos não têm o nome do pai na certidão de nascimento.

Por outro lado, 152.602 conseguiram a adoção ou a inclusão do nome do pai nos documentos oficiais. Isto é, 0,8% do total de crianças que obtiveram o reconhecimento de paternidade.

Importância do laço paterno

É claro que o número de pais que registram seus filhos é muito maior, e tanto na média nacional quanto na estadual gira em torno de 95%. Ou seja, a cada 20 crianças nascidas, 19 pais assumem seu papel.

A distorção entre os outros 5% e a quantidade destes filhos que conseguem o vínculo paternal é que preocupa especialistas. A professora de pós-graduação em Educação da Ulbra, Carin Klein, estuda as políticas públicas em programas sociais como Bolsa Escola e Primeira Infância Melhor. Para ela, se por um lado eles fornecem subsídios para mães solo, por outro invisibilizam e retiram a responsabilidade do homem na educação.

"Em muitas dessas políticas só se pergunta o nome da mãe. Se naturaliza que a criança tem mãe, talvez tenha pai ou talvez não tenha."

Segundo Carin, a oficialização da paternidade não afeta diretamente no acesso aos benefícios e direitos de uma criança. Porém, em um âmbito bem mais profundo, é fundamental na formação de cada indivíduo.

"Um sujeito se constitui como sujeito levando em conta que tem um pai e uma mãe ou que algumas pessoas desenvolvem funções de mãe e pai. É importante para compreender como nos constituímos", acrescenta.

Entre as alternativas para incluir o homem na composição familiar, a professora sugere que eles acompanhem as gestantes nos exames pré-natal e que também seja discutida a legislação a respeito da licença após o nascimento, que concede quatro meses à mulher e cinco dias ao homem. Mas, acima de tudo, repensem o papel masculino na família.

O lapso da ausência do sobrenome paterno de Bruno Lopes foi desfeito em maio deste ano. No dia 20 de maio, Rodrigo deixou a câmera gravando o computador enquanto apresentava ao filho seu novo documento. (Veja o vídeo abaixo). Entre choro, abraços e embargo na voz, Bruno resumiu o que sentia: "Quero ser que nem tu".

Rodrigo foi casado com Rejane Carneiro, com quem teve uma filha e que morreu de câncer em 2013. Ele já morava em São Paulo quando soube que a ex-companheira seria mãe solo de um menino de outro relacionamento e, então, passou a cuidar de ambos.

"Tem que ver as asneiras que ouvi quando a mãe dele morreu. 'Cara, tu tem tua vida, tu é jovem, pode viajar, pode morar em qualquer lugar'. Tive proposta para morar em Cancún na minha área. E eu disse que não trocaria nada pelo Bruno. Vou tentar suprir tudo isso junto dele", diz.

Rodrigo revela que o filho também está feliz com a repercussão. Apesar da idade, ele é incluído nas ações de solidariedade que o pai promove. A transmissão de valores no dia a dia é uma maneira de devolver o carinho que ambos vêm recebendo.

E, de certa forma, servir de exemplo para que os laços de outras famílias sejam fortalecidos.

"Fico chocado que muitos pais biológicos abandonam seus filhos. Estou recebendo relatos diários de mães dizendo: 'Cara, tu não é pai dele e quis ficar com ele, e o meu marido não quer ficar com meu filho'. Isso está me chocando de uma maneira! Gente dizendo que sou uma esperança masculina na vida de criança. Não tem nada de anormal. Sou uma pessoa cheia de defeitos, trabalho, estudo, tento namorar, tento viajar. Mesmo com 45 anos, quero mais, no sentido de agregar e construir uma base bacana para o Bruno", afirma.

Fonte: G1 RS