No começo era um clube para poucos, uma vez que as incorporadoras precisavam ser ranqueadas no GERIC da Caixa Econômica Federal (CEF, a operadora e administradora do sistema), mas no desenvolver do programa o GERIC acabou sendo aberto para todas as incorporadoras, inclusive estrangeiras. E os subsídios e taxas de juros eram impraticáveis em 2008 quando foi criado. A grande sacada do “Minha Casa, Minha Vida” era que os recursos para esse programa vinham também do Tesouro Nacional (problema 3), além do suspeito de sempre: o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Assim, a CEF tinha liberdade para definição de taxas, criação de uma linha de crédito que financiasse diretamente o comprador de imóveis ainda em construção, e dar subsídios para os compradores com renda entre 1 e 2 salários mínimos. Até 2019, o “Minha Casa, Minha Vida” havia entregado 5,7 milhões de unidades em 10 anos. Mas, na somatória dos problemas 1, 2 e 3, o programa perdeu força. A CEF não tinha estrutura para acompanhar o ritmo das incorporadoras na medição de obras. Assim, os pedidos de desembolso dos recursos necessários para a construção eram sistematicamente atrasados, ao ponto de a CEF criar uma linha de crédito específica para as incorporadoras, a fim de fazer frente aos atrasos de desembolso do “Minha Casa, Minha Vida”. Tentou-se até inserir o Banco do Brasil na operação do sistema, mas a falta de estrutura persistiu. Tal atraso fora um golpe muito forte para as incorporadoras, que acabaram endividando-se no crédito rotativo a juros de mercado por conta dos atrasos da CEF na liberação das parcelas. Pelo fato de as incorporadoras já outorgarem a propriedade das unidades aos compradores, e estes as alienarem fiduciariamente à CEF, o projeto ficava engessado. Qualquer alteração demandaria a aprovação de todos os adquirentes de unidades. A inadimplência da CEF começou a sair dos patamares de controle (vale lembrar que os compradores de unidades é que eram devedores da CEF, desde o pagamento do sinal). Por conta dos mecanismos institucionais do programa, as incorporadoras (que já estavam endividadas pelos atrasos de desembolso da CEF) eram solidariamente responsáveis pelos compradores de unidades junto à CEF. E tudo isso resultou em unidades habitacionais de péssima qualidade. Tanto que, ao final, a brincadeira era: “A vida do mutuário do ‘Minha Casa, Minha Vida’ é ruim? Sim! Então, imagine a casa”. Um dos grandes problemas do “Minha Casa, Minha Vida”, ao longo do tempo, foi a inadimplência, que hoje está na casa de 44,20%, sendo a CEF ré em cerca de 37 mil processos. Cabe ressaltar que essa inadimplência começou a sair do controle no segundo mandato do governo Dilma. Já o “Casa Verde e Amarela”, que acaba de ser lançado pelo governo Jair Bolsonaro para substituir o “Minha Casa, Minha Vida”, visa a financiar compradores de unidades imobiliárias com renda mensal de até R$ 7 mil (isso não é novidade), para famílias na zona urbana e R$ 84 mil (ano) para famílias na zona rural, além da regularização das casas, loteamentos e condomínios irregulares. As duas últimas são novidades. Outra alardeada “novidade” é que os imóveis serão colocados no nome da mulher, mas isso já não é tão novidade assim, uma vez que essa política começou em São Paulo, quando o então governador Mário Covas (1930-2001) adotou esse modelo no programa habitacional que o governo do estado desenvolvia por meio da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU). No programa “Casa Verde e Amarela”, os juros serão setorizados e as regiões Norte e Nordeste serão beneficiadas com juros de até 0,25% ao ano. O programa admite a operação por intermédio de agentes privados, e a execução das garantias prestadas pelos compradores de unidades habitacionais poderá ser feita sem leilão das unidades dos adquirentes inadimplentes. Ou seja, quem não pagar a prestação do imóvel perde direito para o credor, que recolocará a unidade em comercialização. De resto, o Casa Verde Amarela é equivalente ao Minha Casa Minha Vida, até a Lei é a mesma: 11.977/2009. O “Casa Verde Amarela” hoje é a Medida Provisória 996, com vigência até fevereiro de 2021. Atenção: os problemas 1 e 2 do Minha Casa Minha Vida não foram considerados na elaboração do Casa Verde e Amarela. Outra coisa é o desafio de desembolsar dinheiro para imóvel que não tem matrícula (existem regras para o FGTS emprestar dinheiro que estão relacionadas às garantias imobiliárias que deverão ser outorgadas). Regularização fundiária é feita para criar matrículas de imóveis junto aos cartórios de registro de imóveis. No fim das contas, as novidades não são tantas. E, como é costume na política nacional, troca-se o nome de programas, para dar uma “marca própria” ao governo de plantão. Casa Verde é um bairro de São Paulo que concentra três escolas de samba: Império de Casa Verde, Morro da Casa Verde e Unidos do Peruchão. Casa Amarela é o bairro de Recife, que representa o maior colégio eleitoral da capital pernambucana. Ou seja, samba e voto!
Fonte: Jota. Foto: Bruno Peres