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Ponderações relevantes sobre a separação de corpos.

escrevente técnico-judiciário da 1.ª Vara da Família e das Sucessões da Comarca de Santos (SP), pós-graduanda em Direito Processual Civil pela Universidade Catótlica de Santos Aspectos processuais, substanciais e seu tratamento pela doutrina e jurisprudência modernas INTRODUÇÃO O presente trabalho se destina ao estudo das medidas de separação de corpos e de afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal, que ordinariamente são tratadas pelo gênero "cautelar de separação de corpos". Com a intenção de reunir, num só escrito, os aspectos substanciais e processuais da medida, porém sem a pretensão de esgotar os temas abordados, seu desenvolvimento se deu pela análise de diversificada doutrina sobre o assunto e coleta de jurisprudência, relevante para demonstrar o posicionamento atual dos tribunais acerca das discussões existentes. Num primeiro momento, cuidou-se dos aspectos gerais das medidas provisionais do art.888 do CPC, tratando de sua natureza controvertida, seu procedimento e da problemática da coisa julgada material. Tal incursão, ainda que breve, fez-se necessária para o estabelecimento de premissas essenciais para compreensão da temática central deste artigo. Passou-se, então, ao exame, em detalhes, da medida de separação de corpos e suas peculiaridades, estudo relevante diante de seu uso reiterado no cotidiano forense. Para tanto, optou-se por uma abordagem mais didática, de acordo com as formas pelas quais a medida se apresenta na prática diária do operador do direito. Após analisar cada uma das modalidades, seu cabimento e seus desdobramentos, inclusive nas hipóteses de união estável, o estudo se voltou para questões comuns às diversas medidas, como a definição da competência e alguns aspectos procedimentais. No campo do direito material, foram abordados os efeitos mais relevantes da separação de corpos. Por fim, o enfrentamento do problema da caducidade, que deve ser solucionado em atenção aos princípios e objetivos que orientam a atuação jurisdicional na será do Direito de Família. De outras medidas provisionais Em seu art.888, inserido na Seção XV do Capítulo II (Dos procedimentos cautelares específicos) do Livro III (Do processo cautelar), o Código de Processo Civil prevê uma série de medidas que qualifica como provisionais. O vocábulo provisional exibe, na língua e na praxe jurídica, sentido ambíguo e equívoco, na medida em que é relativo à provisão (provimento, provisão, o que se destina ao atendimento de uma necessidade) e também a provisório (temporário ou ligado a algo definitivo). A divergência interna do próprio termo se irradia para a doutrina no tocante à definição da natureza das providências enumeradas no referido art.888, sobretudo em relação àquelas previstas nos inc.II a VII, de aplicação no Direito de Família e que veiculam pretensões e valores de ordem pessoal e relevante. 1.1. Natureza jurídica das medidas provisionais Há, na doutrina, nítida diversidade de opiniões acerca da natureza das providências em exame. Luiz Orione Neto é firme ao asseverar que, "embora regulada no Livro III, que cuida do processo cautelar, a medida provisional possui nítido contorno de satisfação de alguma pretensão de direito material, pois o deferimento da providência, na verdade, não se faz para servir a outro processo, dito principal.. .. Na tutela provisional, frise-se, o pedido veiculado é de índole satisfativa, visando provimento que possibilite o prevalecimento do interesse do demandante, sob a perspectiva do direito material. E isso repele o efeito cautelar, em que a tutela consiste, primacialmente, em assegurar a eficácia da pretensão veiculada na ‘actio principalis’". [01] Para reforçar sua posição, o mesmo autor sugere que a dicção do art.889 demonstra a opção do legislador pátrio por excluir as chamadas medidas provisionais do âmbito das cautelares, concluindo que, se cautelares fossem, desnecessário seria dispor expressamente sobre a aplicação do procedimento estabelecido pelos arts.801 a 803 às mesmas. Humberto Theodoro Junior sustenta entendimento mais ponderado: "Na verdade, as medidas em questão, na quase totalidade, embora elencadas no bojo do processo cautelar, correspondem tecnicamente a providências de antecipação de tutela, visto que atendem, em maior ou menor grau, à satisfação de pretensões ligadas ao mérito do processo principal". [02] Pontes de Miranda [03], por sua vez, afirma que as medidas provisionais a que se referem os arts.888 e 889 não se identificam com as espécies das Seções I a XIV do Capítulo II, vale dizer, dos Procedimentos Cautelares Específicos, e também com aquelas decorrentes do poder geral de cautela (arts.798 e 799). Isto significa que, se os casos elencados no art.888 apresentarem os elementos próprios das medidas cautelares, como o fumus boni iuris e o periculum in mora, elas terão tratamento tipicamente cautelar. Candido Dinamarco e Ovídio Araújo Baptista da Silva [04] fazem explanação casuística. O primeiro não considera cautelares as seguintes medidas dentre o rol do art.888: obras de conservação em coisa litigiosa (trata-se de jurisdição voluntária); entrega de bens de uso pessoal do cônjuge e dos filhos (a ação seria principal satisfativa); afastamento do menor autorizado a contrair matrimônio contra a vontade dos pais; guarda e educação dos filhos, regulado o direito de visita (ação principal) e interdição ou demolição de prédio para resguardar a saúde, a segurança ou outro interesse público. Já o segundo não julga cautelares, dentre outras, a entrega de bens de uso pessoal do cônjuge e dos filhos, a posse provisória dos filhos e o afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal. Preferimos a posição intermédia adotada por Victor A. A. B. Marins [05], a qual ressalta a heterogeneidade das providências referidas no dispositivo em estudo e cujas razões ora passamos a transcrever: "Sabe-se que as providências insculpidas no Livro III do Código são heterogêneas e que o ‘nomen iuris’ dado à pretensão não revela sua natureza processual. Note-se, por exemplo, que a produção antecipada de prova pode ou não ser cautelar, bem como a busca e apreensão e assim por diante. Tudo depende das circunstâncias do caso concreto e da necessidade do interessado. O legislador inseriu no Livro III não só medidas cautelares como também provimentos de índole satisfativa e de jurisdição voluntária, de modo que cabe ao intérprete, ao examinar o caso concreto, verificar a que categoria pertence. Com efeito, as circunstâncias do caso concreto e a necessidade do interessado delimitarão o perfil do provimento processual adequado. As providências mencionadas no art.888, por conseguinte, podem revelar-se cautelares ou satisfativas dependendo da conjuntura. Eis alguns exemplos: durante ou após separação judicial, em que já se deu a separação de corpos, um dos cônjuges, ou ex-cônjuges, verifica que bens do seu uso pessoal ficaram com o outro. O dono tem direito subjetivo de reaver tais bens. O art.888, II, assegura para a hipótese o procedimento dos arts.801 a 803, conforme disposição do art.889, mas, induvidosamente, não se trata de medida acautelatória porquanto nada acautela e sim satisfaz o direito e a pretensão do interessado. Pretensão processualmente satisfativa, porém procedimentalmente cautelar, por seguir o procedimento a esta categoria processual reservado. Em perspectiva diversa, o afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal pode ocorrer mediante medida cautelar, desde que evidenciados os requisitos típicos, quais sejam o ‘fumus boni iuris’ (aparência de um direito) e o ‘periculum in mora’ (situação de perigo iminente para o cônjuge que pretende se afastar). Esta demanda pode ser antecedente ou incidental a, por exemplo, processo de separação judicial. Já a interdição de prédio para ‘resguardar a saúde, a segurança ou outro interesse público (art.888, VIII) tanto pode ser cautelar (se presentes os requisitos típicos, inclusive a acessoriedade), como satisfativa (se a tanto chegar a pretensão do autor), obedecendo, em qualquer caso, ao procedimento dos arts.801 a 803." De fato, muito embora as medidas previstas no art.888 se enquadrem no conceito de tutela de urgência, não há como definir, de antemão, a natureza de cada uma delas, pois, como visto, esta varia de acordo com as peculiaridades da situação posta à apreciação do juiz. Assim, se a mãe pleiteia a guarda exclusiva de seus filhos em razão de o comportamento do pai comprometer o desenvolvimento dos menores, o pedido e, consequentemente, o provimento, terão natureza cautelar, pois servirão a afastar o risco gerado pelo exercício nocivo do encargo pelo pai, preservando a integridade dos infantes até que, no processo principal, todas as questões sejam solucionadas definitivamente. A medida prevista no inciso VII do art.888 assumirá, porém, feição satisfativa, se, por exemplo, o pedido é de atribuição da guarda ao genitor que reúne melhores condições econômicas para a criação de seus filhos e conta com a anuência da parte contrária, inexistindo qualquer perigo ou prejuízo às crianças e servindo a tutela apenas para regularizar a situação das mesmas, prescindindo mesmo de uma ação futura. Forçoso concluir, portanto, que as medidas provisionais poderão assumir, no caso concreto, o caráter de: (a) tutelas principais de direito material, quando prescindirem de ação posterior, satisfazendo integralmente a pretensão deduzida; (b) tutelas satisfativas provisórias, quando resolverem parcialmente o litígio que será amplamente versado no processo principal e, (c) tutelas cautelares, desde que presentes os requisitos específicos deste provimento processual. 1.2. Procedimento As medidas provisionais podem ser ordenadas ou autorizadas antes da propositura da ação principal ou durante o curso desta. O verbo ‘ordenar’, presente no caput do art.888 e no parágrafo único do art.889, contraposto ao ‘autorizar’, torna claro que a providência poderá ser decretada de ofício, inclusive liminarmente. O requerimento da medida, quando antecedente ou preparatório, observará o procedimento estabelecido nos arts.801 a 803, conforme disposição expressa do art.889, que ainda alberga, em seu parágrafo único, a possibilidade de concessão de liminares sem a audiência do requerido (inaudita altera pars). O procedimento é o mesmo, qualquer que seja a natureza da pretensão, impondo salientar que o rito se qualifica como especial sumário – e não cautelar – se esta for satisfativa ou principal, caso em que a liminar tem caráter antecipatório e o ajuizamento de ação posterior pode ser dispensável. Já tendo sido proposta a ação principal, todas as medidas provisionais, inclusive as cautelares, poderão ser processadas incidentalmente, sem necessidade de formação de processo autônomo, sobretudo em razão da fungibilidade contemplada no art.273, §7.º. 1.3. Coisa julgada material De acordo com o exposto acima, as medidas provisionais do art.888 podem ter caráter satisfativo ou assecuratório, de acordo com as circunstâncias do caso concreto e a necessidade do interessado. Mister, por isso, enfrentar a problemática da coisa julgada material em relação às duas espécies de provimento. Quando "a tutela