A resolução do Conselho Nacional de Justiça que visa regulamentar a adoção, a guarda e tutela de crianças e adolescentes por casal ou família monoparental, homoafetiva ou transgênera é benéfica e reforça a defesa do mandamento constitucional da dignidade da pessoa humana. Essa é a opinião da maioria dos especialistas em Direito de Família consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico.
O texto aprovado pelo CNJ determina que os tribunais e à magistratura zelem pela igualdade de direitos no combate a qualquer forma de discriminação à orientação sexual e à identidade de gênero.
A resolução veta, por exemplo, que nos processos de habilitação de pretendentes e nos casos de adoção de crianças e adolescentes, guarda e tutela, manifestações contrárias aos pedidos pelo fundamento de se tratar de família monoparental, homoafetiva ou transgênera.
Luiz Kignel, sócio de PLKC advogados, afirma que a determinação do CNJ atendeu a uma necessidade, já que é consenso da jurisprudência pelo Supremo Tribunal Federal e da legislação que as famílias têm que ter o mesmo tratamento, sejam as famílias ditas tradicionais, mas também as famílias monoparentais ou com pai ou com mãe, da mesma forma as famílias homoafetivas ou transgêneras.
“É interessante porque esse debate não deveria existir, porque já é uma decisão do Supremo Tribunal Federal, já é uma questão dita superada, mas ela se torna necessária porque existe um aculturamento. Então você tem uma determinação, um mandamento constitucional da dignidade da pessoa humana, você tem uma determinação judicial da igualdade dos tipos de uniões, das diferentes variáveis de uniões familiares, mas é sempre necessário corroborar isso, por conta de uma formação também da base de quem decide, de quem aprecia, de quem analisa os casos de adoção”, pondera.
Já Karla de Camargo Fischer, sócia do escritório Camargo Fischer Advogados Associados, entende que os direitos dos casais homoafetivos já estavam garantidos pela Constituição Federal brasileira. “A nova resolução vem ao encontro do que já deveria estar sendo praticado pelo Poder Judiciário, no sentido de combater qualquer forma de discriminação pautada na orientação sexual e identidade de gênero.”
A resolução do CNJ também reforça um movimento da jurisprudência de reforçar o papel do Estado laico na garantia dos direitos dos brasileiros. Nesse sentido, o Judiciário tem passado a encarar o vínculo afetivo como elemento norteador da instituição familiar, sem a rigidez formalista de outros tempos, que era pautada por valores morais e não pelo texto constitucional.
“É disto que se trata esta nova orientação do CNJ que, na esteira da busca da igualdade material (em contraste com a meramente formal) entre as pessoas, suscita e provoca os agentes do Estado e os operadores do Direito à uma prática igualitária atenta e endereçada aos cidadãos jurisdicionados sexualmente orientados por seus desejos mais genuínos e que em um olhar interdisciplinar convocado pela psicanálise enquanto tradutora dos termos “funções maternas e funções paternas”, podem exercer seus direitos mais plenamente quando o assunto é a constituição de família (em seu sentido mais plural), nivelando assim por cima a sociedade contemporânea”, afirma Fábio Botelho Egas, sócio do Botelho Galvão Advogados. .
Para Ricardo Calderón, diretor nacional do IBDFAM, a resolução do CNJ vem em boa hora e deve ter um importante impacto no cenário da infância, em especial nos casos de adoção. “Esse ato normativo foi fruto de um processo interno do Conselho Nacional da Justiça, que ouviu diversos atores que militam na infância, bem como fez uma ampla pesquisa com o diagnóstico de como essa questão, efetivamente, merece ser tratada”, afirma.
Segundo especialistas, os entraves para adoção por famílias homoafetivas muitas vezes eram implícitos. “A partir desta constatação, ou foi bem o Conselho Nacional da Justiça aprovar esta resolução, de modo que podemos dizer que é um primeiro passo para a garantia desses direitos de casais homoafetivos e até mesmo das famílias homoparentais que querem adotar crianças e adolescentes”, explica.
Por fim, o advogado Felipe Martarelli acredita que a resolução do CNJ é benéfica, mas não é o suficiente. “O CNJ não é, em regra, fonte primária formal de Direito, a lei é; isso significa que, um direito tão importante e fundamental, como este, não está sendo respaldado pela lei, o que torna uma proteção frágil, em uma país positivista”, afirma.
Fonte: Consultor Jurídico (ConJur)