Background

Artigo: É possível estipular regime de bens na União Estável com efeitos retroativos ao início do relacionamento? - Por Júlio Martins

O Contrato de União Estável embora não seja requisito tem bastante utilidade para comprovar o relacionamento e inclusive afastar o regime da comunhão parcial de bens, conforme art. 1.725 do CCB.

A UNIÃO ESTÁVEL se distingue do Casamento também por não precisar de um Contrato Escrito para sua caracterização (sendo que nas doutrinas mais antigas era inclusive chamada de "União Livre"). O artigo 1.723 do Código Civil nesse sentido esclarece sobre a União Estável:

"Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família".

O casamento só existe se houve registro em Cartório e a materialização/comprovação deste registro se dá com a Certidão que atesta o conteúdo existente no Livro próprio do Registro Civil. Ocorre que em sede de União Estável o Contrato Escrito embora não seja REQUISITO é admitido e reconhecido nos termos do art. 1.725 do Código Civil como possibilidade para afastar o "regime padrão" vigente na União Estável. Assim reza o artigo 1.725:

"Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens".

É importante observar que ENQUANTO NÃO EXISTIR CONTRATO ESCRITO valerão as regras do referido artigo 1.725 do Código Civil - ou seja, mesmo sem "conhecer as regras" do Código Civil os companheiros podem estar vivendo sob o regime da comunhão parcial (a única ressalva que fazemos diz respeito a quando for aplicável ao caso de união estável também as regras do Código Civil - art. 1.641 - que impõe o regime da "separação obrigatória de bens" - embora não comunguemos com tal posição). A solução para reverter isso - e é muito importante que as partes tenham consciência do que é a União Estável e principalmente seus efeitos - pode ser a elaboração de um Contrato Escrito (e isso pode ser feito por Instrumento Particular, Escritura Pública ou mesmo TERMO DECLARATÓRIO formalizado perante o Registro Civil, conforme art. 94-A da LRP, recentemente modificado) porém, via de regra, os efeitos patrimoniais oriundos do regime de bens escolhido não são retroativos - ou seja, só valem da assinatura do documento para a frente.

Será que cabe exceção a essa regra? Sim, a resposta é positiva!

Como se sabe, é no contrato escrito que as partes podem afastar o regime padrão (da comunhão parcial de bens) com a escolha de um outro REGIME DE BENS. Todos os regimes já elencados pelo Código Civil são elegíveis (comunhão parcial, comunhão universal, separação de bens e participação final nos aquestos) sendo possível inclusive a elaboração de um regime especial, particular e personalizado para os companheiros, desde que é claro as normas não infrinjam a Lei (art. 1.655 c/c art. 1.639).

Quando o [novo] regime de bens escolhido for o da COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS é necessário notar que é da essência desse regime a RETROATIVIDADE já que ele abarca os bens presentes e futuros de cada cônjuge/companheiro, como diz o art. 1.667 do Código Reale. Não por outra razão com muito acerto o par.4º do art. 547 do Código Nacional de Normas Extrajudiciais do CNJ (Provimento CNJ 149/2023) destaca em sede de "Alteração de regime de bens na União Estável":

"§ 4º. O novo regime de bens produzirá efeitos a contar da respectiva averbação no registro da união estável, não retroagindo aos bens adquiridos anteriormente em nenhuma hipótese, em virtude dessa alteração, observado que, se o regime escolhido for o da COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS, os seus efeitos atingem todos os bens existentes no momento da alteração, ressalvados os direitos de terceiros".

Como sempre recomendamos, seja em qualquer das formas escolhidas para regulamentar a União Estável o melhor conselho será sempre procurar um Advogado Especialista que é o único profissional autorizado a prestar assessoria jurídica (especialmente nesses casos), na forma do inciso II do art. 1º da Lei Federal 8.906/94.

POR FIM, decisão recente do STJ que com todo acerto já esperado confirma a retroatividade do regime de bens quando o regime escolhido for o da COMUNHÃO UNIVERSAL, o que tem plena aplicação também na União Estável:

"STJ. REsp: 1671422/SP. J. em: 25/04/2023. RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS DE SEPARAÇÃO TOTAL PARA COMUNHÃO UNIVERSAL. RETROAÇÃO À DATA DO MATRIMÔNIO. EFICÁCIA" EX TUNC ". MANIFESTAÇÃO EXPRESSA DE VONTADE DAS PARTES. COROLÁRIO LÓGICO DO NOVO REGIME. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Nos termos do art. 1.639, § 2º, do Código Civil de 2002,"é admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros". 2. A eficácia ordinária da modificação de regime de bens é" ex nunc ", valendo apenas para o futuro, permitindo-se a eficácia retroativa (" ex tunc "), a pedido dos interessados, se o novo regime adotado amplia as garantias patrimoniais, consolidando, ainda mais, a sociedade conjugal. 3. A RETROATIVIDADE será corolário lógico do ato se o novo regime for o da COMUNHÃO UNIVERSAL, pois a comunicação de todos os bens dos cônjuges, presentes e futuros, é pressuposto da universalidade da comunhão, conforme determina o art. 1.667 do Código Civil de 2002. 4. A própria lei já ressalva os direitos de terceiros que eventualmente se considerem prejudicados, de modo que a modificação do regime de bens será considerada ineficaz em relação a eles (art. 1.639, § 2º, parte final). 5. Recurso especial provido, para que a alteração do regime de bens de separação total para comunhão universal tenha efeitos desde a data da celebração do matrimônio (" ex tunc ")".

Fonte: Jornal Jurid