No Brasil, a despeito do passar do tempo e da mudança do modelo familiar, o ordenamento jurídico não avançou para se moldar à realidade de maneira igualitária, no que diz respeito à licença-paternidade, que permanece bem distante do direito análogo concedido às mães. Fato é que o exíguo prazo de cinco dias para o gozo do direito do pai estar com seu filho recém-nascido não se compatibiliza mais com a realidade.
Embora exista norma transitória fixando um período para o gozo da licença-paternidade, garantindo que não seja inviabilizado por completo o exercício desse direito, a subsistência de regra, por tão longo período, que deveria ostentar natureza provisória, evidencia a omissão do Poder Legislativo em deliberar sobre a questão.
Uma semana útil para a licença-paternidade não se coaduna mais com a dinâmica das famílias brasileiras, sob diversos aspectos, pois a ideia de família não é mais a mesma de 1988. Esse prazo tem como fator a violação aos preceitos constitucionais, contribuindo para a manutenção de uma sociedade patriarcal.
A licença-maternidade é tratada com certa abrangência na Constituição Federal (CF) e na CLT, independente do seu estado civil, a fim de priorizar o amparo materno. Os prazos de concessão podem variar de 120 dias para 180, sendo este prazo máximo decorrente da previsão da Lei 11.770/2008, que estabeleceu o Programa Empresa Cidadã, propiciando à mulher a oportunidade de estender o período da licença-maternidade por mais 60 dias.
O referido programa também garantiu que a licença paternidade, antes de cinco dias de afastamento, fosse estendida para 20 dias, o que se verifica no artigo 1º, II da Lei 11.770/2008.
Mesmo diante de toda a regulamentação constitucional em prol da garantia da igualdade de gênero, a previsão do prazo de licença-paternidade, ainda que aumentado pela citada lei de 2008, não progrediu, mantendo, ainda, uma prática discriminatória, discordante do conceito de família existente atualmente. O simples fato de ser distinto e menor do que o prazo da licença maternidade demonstra que os modelos de famílias atuais não foram levados em conta, já que, nos dias de hoje, as famílias se formam também por casais de mesmo sexo.
O legislador constituinte manteve discriminações entre homens e mulheres, pois o privilégio notável é visto, por exemplo, através da licença gestante; da proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos próprios; do prazo menor para obter aposentadoria por tempo de serviço; e da estabilidade provisória.
Assim, a licença-maternidade e a licença-paternidade, chamadas de licenças parentais, previstas no artigo 7º, XVIII e XIX da CF, são tratadas de forma diferenciada pelo legislador infraconstitucional, mesmo diante da proteção à família estabelecida no artigo 226, §5° da CF, que prevê que os pais têm direitos e deveres iguais, sem distinção de gênero.
Uma alteração relevante, mas tímida, em relação à licença dos pais, se deu com a inserção do § 5º, no artigo 392-A da CLT, que trouxe a possibilidade da licença-maternidade por casais homoafetivos e estabelece que a adoção ou guarda judicial conjunta ensejará a concessão de licença-maternidade a apenas um dos adotantes ou guardiães.
O referido dispositivo celetista também assegura aos pais biológicos, além da licença-paternidade, a concessão da licença-maternidade na hipótese em que a mulher faleça por ocasião do parto.
Como já exposto, além da modificação dos artigos 392-A, 392-B e 392-C da CLT, o Programa Empresa Cidadã instituiu a licença-paternidade com a concessão de um prazo de 15 dias, além dos cinco dias estabelecidos no § 1º do artigo 10 do ADCT, mas ainda se vê rarefeita, neste particular, a promoção da igualdade de gêneros.
Seria um enorme passo para a efetivação da isonomia entre gêneros a implantação de uma lei que regulamentasse a licença-paternidade, da mesma forma que a licença-maternidade, pois restaria fragilizada a divisão sexual do trabalho, em especial a atribuição do trabalho doméstico às mulheres e o direcionamento dos homens para a atividade produtiva.
O STF está na iminência de decidir se o Congresso foi omisso ao não regulamentar a licença-paternidade, pois, em breve, será julgada uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO 20 DF 9965631-95.2012.1.00.0000), que tem como objeto a ausência de regulamentação do disposto no artigo 7°, XIX da CF, segundo o qual a licença-paternidade é direito social dos trabalhadores urbanos e rurais, "nos termos fixados em lei".
Na ação, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde requer que o STF fixe um prazo para que seja feita a regulamentação e, após terminado o prazo, que a licença aos pais seja equiparada à licença-maternidade.
Da análise dos votos já disponibilizados, a maioria dos ministros julga o pedido procedente, com a fixação do prazo de 18 meses para o Congresso sanar a omissão legislativa. Até o momento, há cinco votos reconhecendo a mora do Legislativo e já foram disponibilizados votos no sentido de que, findo o referido prazo, caso a omissão persista, passará a valer a equiparação entre os prazos das licenças maternidade e paternidade até que sobrevenha a regulamentação.
Nesse cenário, com ou sem a regulamentação sobre essa questão, o ordenamento jurídico precisa acompanhar as mudanças sociais e se adequar às necessidades de todos os cidadãos de forma que não haja desigualdades entre homens e mulheres, assegurando, portanto, a total ausência de discriminação de gênero.
Fonte: Consultor Jurídico (ConJur)