A Lei do Bem concede isenção de IRPF contanto que certos requisitos sejam cumpridos, mas a IN SRF 599, de 28 de dezembro de 2005, apresenta algumas limitações a obtenção da isenção citada. A Lei do Bem (lei 11.196/05) dispõe, principalmente, sobre concessão de incentivos fiscais para a inovação fiscal. No caso do Imposto de Renda da Pessoa Física – IRPF, a referida lei isenta o ganho auferido por pessoa natural residente no país na venda de imóveis residenciais, contanto que o alienante, no prazo de 180 dias contado da celebração do contrato, aplique o produto obtido na venda em aquisição de imóveis residenciais localizados no país. A IN SRF 599, de 28 de dezembro de 2005 dispõe sobre os artigos 38, 39 e 40 da Lei do Bem, que tratam do imposto de renda incidente sobre ganhos de capital das pessoas naturais. Esta instrução normativa trouxe algumas limitações a isenção do artigo 39 da lei citada. A aquisição é o meio pelo qual se obtém uma coisa, ou seja, a aquisição transfere a propriedade. De acordo com o Código Civil de 2002, a aquisição de imóvel está condicionada ao registro no Cartório de Registro de Imóveis (art. 1.245, CC/2002). Enquanto não ocorrer o registro do título translativo, o alienante (vendedor) continua a ser o dono do imóvel (art. 1.245, § 1º, CC/2002). Sendo assim, após a pessoa natural vender o primeiro imóvel e em seguida comprar outro imóvel – dentro dos 180 dias – será considerada proprietária do segundo imóvel contanto que faça o registro no Cartório de Registro de Imóveis. No caso de imóvel na planta, a pessoa não é considerada proprietária enquanto não ocorrer o registro imobiliário, visto que, o imóvel na planta ainda não foi individualizado, isto é, não é possível dizer o que é da referida pessoa – que possui apenas uma fração ideal do terreno -, sendo assim, ela possui um direito real à aquisição do referido imóvel até o término da obra, tornando-se compromitente comprador do imóvel residencial na planta No compromisso de compra e venda (contrato preliminar), as partes se comprometem a realizar futuramente um contrato de compra e venda. Logo, a pessoa natural não será proprietária do imóvel na planta enquanto não for feito o contrato e, posteriormente, o registro, como dito anteriormente. Apesar disso, a solução de consulta DISIT/SRRF08 206, de 15 de junho de 2009 aponta que: Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Física – IRPF ALIENAÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL. ISENÇÃO Está isento do imposto de renda o ganho de capital auferido por pessoa física que alienar imóvel residencial, e no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contados da data da celebração do contrato aplicar o produto da alienação na aquisição de outro imóvel residencial. CONTAGEM DO PRAZO PARA AQUISIÇÃO DO OUTRO IMÒVEL Estabelecendo a lei que, para efeitos de incidência do tributo, considera-se alienação a operação que importa a transmissão ou promessa de transmissão a qualquer título, de imóveis, ainda que através de instrumento particular, e que a data da alienação será aquela em que foi celebrado o contrato inicial da operação imobiliária, o Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra acompanhado do recibo de quitação, constitui documento hábil para comprovação da data de aquisição do outro imóvel residencial. Dispositivos Legais: Art. 3º, § 3º, da lei 7.713, de 22.12.1988; art.39 da lei 11.196, de 21.11.2005; arts. 117 e 123 do decreto 3.000, de 26.3.1999 (republicado em 17.6.1999); e art. 2º da IN SRF 599, de 28.12.2005. (grifos meus). Como mostrado acima, o registro no cartório de registro de imóveis não é exigido. A Receita Federal aponta que a isenção será aplicada também no caso de aquisição de imóvel residencial em construção ou na planta, com base no “Perguntas e Respostas IRPF da Receita Federal” (item 545). De acordo com o art. 111, II do CTN, a interpretação concernente a isenção deve ser literal, ou seja, quando se tratar de aquisição de imóvel residencial na planta a pessoa natural ficará isenta do imposto de renda. Vejamos uma decisão referente a imóvel na planta: “Note-se, por oportuno, que a Receita Federal admite a incidência da isenção na hipótese de aquisição de imóvel na planta (“imóvel residencial em construção ou na planta”), que nada mais é do que a aquisição de parcela de terrenos e contratação de construção de prédio no local (art. 2.º, §10, II, da IN 559/05). Nesse sentido, entendo que a IN 599/05, ao não admitir a isenção de ganho de capital quando o recurso é destinado à aquisição de terreno (art. 2.º, §11, II), restringiu indevidamente o espectro de abrangência da Lei 11.196/05, não sendo admissível, como se sabe, a criação, mediante instrução normativa, de restrições que não podem, de modo algum, ser extraídas do texto legal”. (5043043-94.2017.4.04.7100, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS, relatora JOANE UNFER CALDERARO, julgado em 31/1/2019). (grifos meus) A isenção do artigo 39 da lei 11.196/05 se aplica no caso de aquisição de imóvel residencial adquirido na planta, ainda que não se tenha concluído a obra, independentemente da data de escrituração do imóvel em cartório, contanto que o ganho de capital auferido na venda do primeiro imóvel seja usado na aquisição do segundo, no prazo de 180 dias, além de que este imóvel esteja situado no Brasil e o contribuinte não tenha usufruído do benefício em intervalo inferior a cinco anos1. Apesar do que foi dito sobre o que é aquisição de imóvel de acordo com o CC/2002, as decisões demonstram que a isenção de imóvel na planta é possível, ainda que não se tenha registrado o imóvel comprado em Cartório de Registro de Imóveis, o que não seria possível pois o compromisso de compra e venda garante apenas o direito real da aquisição do referido imóvel até o término da obra. A decisão citada anteriormente não aborda sobre o parcelamento da compra, entretanto, a instrução normativa é clara quando aponta que está isento do imposto de renda o imóvel na planta adquirido pela pessoa. A Receita Federal não poderia ir em sentido contrário, pois estaria inovando ao criar restrições que não podem ser extraídas do texto legal, como é citado no acórdão que teve como relatora a dra. Joane Unfer Calderaro. No caso do financiamento, é possível notar a função social da propriedade, visto que, a pessoa natural realiza o financiamento devido ausência de verba para compra à vista – óbvio -, isto é, o indivíduo possivelmente financiará o segundo imóvel antes de vender o primeiro, sendo assim, restringir a isenção do IRPF devido o financiamento é o mesmo que prejudicar o objetivo do artigo 39 da Lei do Bem. A 2ª turma do STJ julgou um caso interessante concernente a financiamento e a isenção do ganho de capital, apontando que uma grande parte das aquisições imobiliárias das pessoas naturais é realizada mediante contrato de financiamento de longo prazo, pois a pessoa natural possivelmente não tem liquidez para adquirir um imóvel residencial à vista2. Compreende-se que a IN SRF 599/2005 está errada, visto que, impôs limitação à obtenção da isenção da lei 11.196/05, sendo que, não havia tal limitação na referida lei. A referida instrução normativa veio para dispor sobre os artigos concernentes a isenção de IRPF, não sendo possível restringir o benefício. As instruções normativas feitas pela Secretaria da Receita Federal não se equiparam e nem são leis. Vejamos uma decisão sobre o assunto: “Considerar que o requisito da isenção prevista na lei 11.196/05 é a aquisição, em si, de novo imóvel, e não a aplicação (na aquisição de novo imóvel) do recurso obtido com a venda de imóvel, leva a uma interpretação equivocada do dispositivo legal, no sentido de restringir o gozo do benefício fiscal instituído em lei, exatamente como o fez a Receita Federal, através da IN/SRF 599/2005. Com efeito, o art. 39 da lei 11.196/05 não autoriza as restrições criadas pela IN/SRF 599/2005, notadamente aquelas previstas nos parágrafos 6º, 7º e 11 do art. 2º dessa norma infralegal” (fl. 200e)”. (REsp 5066350-77.2017.4.04.7100 RS 2019/0172245-1, relatora ministra Assusete Magalhães, publicado em 1º/8/2019). Em virtude do que foi apresentado no presente artigo, conclui-se que as exigências da IN 599/2005 são ilegais. ———- 1 (0012897-94.2011.4.01.3400/DF (d), 8ª turma do TRF da 1ª região, relator juiz federal Roberto Carvalho Veloso (conv.), julgado em 25/4/2014). 2 REsp 1469478 / SC, Resp 2014/0176929-5, relator ministro Herman Benjamin, relator(a) p/ acórdão ministro Mauro Campbell Marques, 2ª turma do STJ, julgado em 25/10/2016, publicado no DJe em 19/12/2016. Fonte: Migalhas