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Artigo: A postura do município diante da Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de somente considerar o fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) com a efetiva transferência da propriedade imobiliária – Por Antônio Cl

1. INTRODUÇÃO Este artigo trata especificamente sobre a posição a ser tomada pela Fazenda Pública municipal diante da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de somente considerar o fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, ou seja, somente após o registro no cartório de registro de imóveis. Recentemente, o STF bateu o martelo e decidiu que a cessão de direitos não gera a obrigação de recolher ITBI aos cofres municipais. O problema é que vários Municípios brasileiros consideram na sua legislação que a cessão de direitos imobiliários configura hipótese de incidência do ITBI. Como resolver este conflito? Inicialmente, será analisado a hipótese de incidência do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI), principalmente à luz do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66) e da Constituição Federal de 1988. O assunto será abordada conforme os 5 (cinco) elementos do fato gerador: a) material; b) territorial; c) temporal; d) pessoal; e e) quantitativo. Em seguida, trataremos da decisão do Supremo Tribunal Federal que considerou o fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) somente com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, ou seja, apenas após o registro no cartório de registro de imóveis. O problema é que vários Municípios brasileiros consideram na sua legislação que a cessão de direitos imobiliários, mesmo sem o respectivo registro no cartório, configura hipótese de incidência do ITBI. Diante do exposto, este trabalho apresenta a seguinte problemática: qual deve ser a postura a ser tomada pelo fisco municipal diante da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de somente considerar o fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) com a efetiva transferência da propriedade imobiliária? A hipótese da pesquisa sugere que os Municípios que prescrevem na sua legislação a cessão de direitos imobiliários como hipótese de incidência do ITBI devem adaptar sua legislação de acordo com o entendimento do STF. O presente trabalho tem como objetivo encontrar uma posição razoável da Fazenda Pública municipal diante da decisão do Supremo Tribunal Federal de considerar fato gerador do ITBI somente a transmissão imobiliária registrada em cartório. A relevância da pesquisa encontra-se no fato de que encontrar uma solução razoável para o problema traz segurança jurídica para o poder público e os contribuintes, além de diminuir o fluxo de processos judiciais por conta de cobrança indevida de ITBI. O método científico utilizado é o dialético, onde se buscou fazer um diálogo entre uma tese (decisão da Suprema Corte) e uma antítese (legislação do fisco municipal sobre ITBI contrária à decisão do STF). A modalidade de pesquisa utilizada será basicamente através de pesquisa bibliográfica (livros, doutrina, artigos científicos, legislação, jurisprudência, entre outros), seja através do meio físico ou eletrônico. 2. A HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO INTER VIVOS DE BENS IMÓVEIS (ITBI) O fato gerador (hipótese de incidência) é a ocorrência de um acontecimento necessário para que o fisco possa exigir do contribuinte o recolhimento do tributo. No Direito Tributário pátrio, qualquer cobrança de tributo requer o acontecimento de um fato (ALVES, 2021). O Código Tributário Nacional não tratou da expressão hipótese de incidência, pois trata-se de uma diferenciação doutrinária. Hipótese de incidência é a descrição abstrata prevista em lei (MACHADO; MACHADO, 2011, p. 97). Por outro lado, fato gerador é o evento concreto praticado no mundo real pelo contribuinte. Fato gerador é a ocorrência, no mundo real, daquilo que está previsto na lei (MACHADO, 2017, p. 131). Ou seja, quando o fato encontra-se apenas descrito hipoteticamente na lei, chamamos isto de hipótese de incidência. Entretanto, no momento que o contribuinte pratica o fato previsto em lei como, por exemplo, a venda de mercadorias, este fato, que era abstrato, passa a ser concreto e chamar-se de fato gerador do tributo. São elementos ou aspectos do fato gerador: subjetivo, material, espacial ou territorial, temporal e quantitativo (ABRAHAM, 2018, p. 204). O elemento material do fato gerador significa a conduta praticada pelo sujeito passivo, isto é, adquirir renda, prestar serviços, ser proprietário de veículo automotor, ser proprietário de imóvel, entre outros (COSTA, 2018, p. 218). O critério material do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) foi disciplinado no art. 35 do Código Tributário Nacional: Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador: I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil; II – a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia; III – a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II. […] (BRASIL, 1966). Até outubro de 1988, data da promulgação da atual Constituição Federal, a transmissão de bens e direitos era tributada apenas por um único imposto de competência dos Estados. Com o advento da atual Carta Magna, essa tributação foi dividida em dois impostos: a) imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI), de competência dos Municípios e do Distrito Federal; e b) imposto sobre a transmissão causa mortis e doação (ITCD), de competência dos Estados e do Distrito Federal. Assim, os Estados ficaram com a tributação da transmissão dos bens e direitos decorrentes de doação ou herança. Por outro lado, os Municípios passaram a tributar a transmissão inter vivo e onerosa de bens imóveis. Dessa forma, a nova roupagem da tributação municipal na Constituição Federal de 1988 sobre a transmissão de bens ficou da seguinte forma: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: […] II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; […] (BRASIL, 1988). Cabe ressaltar que o art. 35 do CTN foi recepcionado pelo art. 156, inciso II, da Constituição Federal de 1988 (HARADA, 2016, p. 140). O elemento espacial, também apontado como territorial, é o lugar do acontecimento do fato (ROCHA, 2018, p. 374). No que diz respeito ao ITBI, é o Município onde está localizado o imóvel, no caso de uma compra e venda de um imóvel. A atual Carta Política delimitou o aspecto territorial do ITBI: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: […] II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; […] § 2º O imposto previsto no inciso II: […] II – compete ao Município da situação do bem. […] (BRASIL, 1988). Portanto, cada Município, ou o Distrito Federal, somente poderá instituir e cobrar imposto sobre a transmissão onerosa de bens imóveis (ITBI) dos imóveis que estiverem situados no seu território. O critério temporal é o momento da ocorrência do evento (MAZZA, 2018, p. 590). É o momento em que surge para o contribuinte o dever jurídico de recolher o imposto (BELTRÃO, 2014, p. 220). No caso do ITBI, é o momento em que ocorre a transmissão do bem imóvel. O Código Civil brasileiro, no seu art. 1.245, estabeleceu o momento em que ocorre a transmissão de bens imóveis: Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. § 2º Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel. (BRASIL, 2002). Desse modo, conforme disposição acima, o momento da transmissão e consequente recolhimento do tributo somente deveria ocorrer quando efetivado o registro no cartório de registro de imóveis. Entretanto, a situação não é tão simples assim, pois existe o caso da cessão de direitos imobiliários, que será tratada no tópico seguinte. O aspecto subjetivo, também chamado de critério pessoal, é dividido em sujeito ativo e sujeito passivo (AMARO, 2017, p. 293). Trata-se dos dois personagens da relação jurídica obrigacional tributária. Um fiscaliza e arrecada (o Município) e o outro (contribuinte) tem a obrigação de recolher o tributo, quando acontece o referido fato gerador. O CTN delimitou o que vem a ser o sujeito ativo da obrigação tributária: Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento. (BRASIL, 1966). Na verdade, o legislador de 1966 não foi muito feliz ao definir sujeito ativo. A sujeição ativa não se confunde com a competência tributária. A competência tributária envolve o direito de instituir o tributo, ou seja, pressupõe competência legislativa para editar normas jurídicas. De outra forma, a sujeição ativa é o direito do ente de administrar o tributo, podendo fiscalizar e arrecadar. No caso do ITBI, a sujeição ativa e a competência tributária pertencem a um mesmo ente federativo, qual seja, o Município ou Distrito Federal, pois ambos têm tanto o direito de administrar o tributo quanto de instituir. O CTN também determina que o sujeito passivo pode ser contribuinte ou responsável: Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei. (BRASIL, 1966). Contribuinte é aquele que efetivamente recolhe o imposto. Em se tratando de imposto sobre transmissão de bens imóveis, regra geral, a legislação municipal elege o adquirente do imóvel como contribuinte do imposto. Responsável é aquele que não é contribuinte, mas tem alguma relação indireta com a transação imobiliária. É o caso, por exemplo, do cartório de registro de imóvel, pois caso pratique alguma infração como, por exemplo, registrar o imóvel sem o devido recolhimento do ITBI, será responsável solidariamente com o contribuinte. Por fim, chegamos ao elemento quantitativo do fato gerador do ITBI. Trata-se da base de cálculo e da alíquota aplicável ao tributo. O art. 38 do CTN determina que a base de cálculo do ITBI é o valor venal dos bens transmitidos. Valor venal é o preço real de venda, isto é, o valor de mercado no momento da alienação (CASTRO; GOUVEA; LUSTOZA, 2017, p. 923). Normalmente o fisco municipal tem setor especializado no assunto para efetivar a avaliação no momento do negócio imobiliário, pois esses valores podem mudar com o tempo. A alíquota é o percentual que incide sobre a base de cálculo. Com o advento da Constituição de 1988, não existe regra que limite o seu percentual (CARNEIRO, 2015, p. 129). No caso do ITBI, a alíquota progressiva é vedada, conforme súmula 656 do STF: É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel. (STF, 2003). Assim sendo, a questão agora a ser estudada é referente à decisão do STF de somente considerar como fato gerador do ITBI a efetiva transferência do imóvel (registro no cartório de registro de imóveis). … 3. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO INTER VIVOS DE BENS IMÓVEIS (ITBI) E A CESSÃO DE DIREITOS Conforme já falado anteriormente, a própria Constituição Federal de 1988 considerou a cessão de direitos como fato gerador do imposto sobre a transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI). É o caso em que uma parte cede a terceiro sua posição em determinado contrato (ARANHA NETO, 2019, p. 40). Trata-se de um tipo de negócio jurídico muito utilizado no ramo imobiliário, mais especificamente apelidado de contrato de gaveta. Neste, o vendedor cede os direitos de passar o imóvel para o nome do comprador. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem se pronunciando, já faz algum tempo, sobre a incidência de ITBI sobre direitos imobiliários não registrados em cartório, mas sem falar da cessão de direitos: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ITBI. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. REGISTRO DE TRANSMISSÃO DO BEM IMÓVEL. BASE DE CÁLCULO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. CONTRARIEDADE A DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXAME. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. MANDADO DE SEGURANÇA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. FUNDAMENTO NÃO ATACADO. SÚMULA 283/STF. ALÍNEA “C”. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. FALTA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL OBJETO DE INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. […] 10. O Tribunal a quo foi claro ao dispor que o fato gerador do ITBI é o registro imobiliário da transmissão da propriedade do bem imóvel. A partir daí, portanto, é que incide o tributo em comento. 11. O fato gerador do imposto de transmissão (art. 35, I, do CTN) é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante registro do negócio jurídico no ofício competente. Precedentes do STJ. CONCLUSÃO 12. Recursos Especiais parcialmente conhecidos e, nessa parte, não providos. (STJ, 2019). Embora o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinasse que o fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) somente ocorria com o registro no cartório de registro de imóveis, o mesmo tribunal não se posicionava sobre a cessão de direitos. Diante do exposto, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi provocado a reconhecer que a controvérsia constitucional era dotada de repercussão geral: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS – ITBI. FATO GERADOR. COBRANÇA DO TRIBUTO SOBRE CESSÃO DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. EXIGÊNCIA DA TRANSFERÊNCIA EFETIVA DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA MEDIANTE REGISTRO EM CARTÓRIO. PRECEDENTES. MULTIPLICIDADE DE RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL DOTADA DE REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO CONHECIDO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. (STF, 2021). O problema é que vários Municípios cobram o ITBI pela cessão de direitos imobiliários sem o devido registro no cartório de registro de imóveis, contrariando o entendimento recente da Suprema Corte. Por exemplo, o Município de João Pessoa possui no seu Código Tributário Municipal (Lei Complementar nº 53/2008) um dispositivo que permite a cobrança do ITBI antes do registro imobiliário: Art. 208. O recolhimento do ITBI será realizado: […] II – na hipótese de lançamento por declaração: a) quando se tratar de cessão de direitos, nos termos do inciso II do art. 199: 1. antes da lavratura ou apresentação, perante o notário ou oficial de registro, do instrumento ou título de cessão do direito; […] (JOÃO PESSOA, 2008). Ou seja, caso alguém faça um contrato particular de compra e venda de um bem imóvel, mas não efetive o registro no cartório de registro de imóveis, segundo a legislação acima, esse fato caracteriza a hipótese de incidência do ITBI. Dessa forma, percebe-se a formação de um conflito entre a decisão do Supremo Tribunal Federal de somente considerar o fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) com a efetiva transferência da propriedade imobiliária (registro no cartório de registro de imóveis) e a legislação do Município de João Pessoa. Aliás, não somente a legislação deste Município paraibano, mas uma centena de prefeituras brasileiras que cobram o ITBI antes do registro imobiliário. O que se percebe é que o STF decidiu pela não incidência do ITBI sobre a cessão de direitos imobiliários, mas não definiu o que vem a ser a cessão de direitos. Ora, a cessão de direitos como fato gerador do ITBI está expressamente prevista na Constituição Federal. O STF precisa explicar qual o sentido do art. 156, inciso II, parte final, da Carta magna. Apesar da decisão recente do STF, na prática, o ITBI é recolhido antes do registro, pois o órgão cartorário deve exigir o tributo já pago para efetivar o registro, sob pena de responsabilidade solidária com o contribuinte do tributo. Acredito que o debate sobre o referido tema está apenas começando. A decisão do STF é muito recente e, provavelmente, outras decisões deverão ser publicadas. Passo agora a tecer algumas soluções para o tema através das considerações finais. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A questão é antiga e envolve um conflito de entendimento entre o judiciário e a Fazenda Pública municipal. Embora a Constituição Federal de 1988 prescreva expressamente que a cessão de direitos imobiliários é fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI), o Supremo Tribunal Federal decidiu recentemente que o referido tributo somente deve ser cobrado com a efetiva transmissão do imóvel, ou seja, com o efetivo registro no cartório de registro de imóveis. O fato tem grande relevância para os Municípios, pois uma quantidade considerável de prefeituras cobram o ITBI sem a necessidade de registro imobiliário, bastando apenas um simples contrato de gaveta ou, em alguns casos, até mesmo um contrato verbal entre as partes contratantes. O descumprimento da decisão do STF por parte dos Municípios somente traria mais instabilidade para o tema e acarretaria custos adicionais para o poder público, pois o contribuinte recorreria ao judiciário para buscar o recolhimento do tributo somente após o registro imobiliário, acarretando o prejuízo de custas judiciais e ônus da sucumbência para o poder público. Acredito que tal discussão não se encerra aqui. O problema agora é saber qual o próximo passo a ser tomado pelo STF, pois questões complexas estão envolvidas, por exemplo, no caso de quem já pagou o ITBI sem o efetivo registro. Como ficará tal situação? Será que a Suprema Corte vai considerar a decisão retroativa ou decidirá somente para frente? São questões que deverão ser enfrentadas em breve pelo STF. Ademais, o STF decidiu que a cessão de direitos imobiliários não configura fato gerador do ITBI, mas não definiu o que vem a ser cessão de direitos, conforme art. 156, inciso II, da Constituição Federal. Diante do exposto, podemos concluir que, como o STF já se pronunciou sobre a cessão de direitos imobiliários, a melhor solução para a Fazenda Pública municipal, no momento, é adequar sua legislação com a jurisprudência do STF. REFERÊNCIAS ABRAHAM, Marcus. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2018. ALVES, Antônio Cláudio. Imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN) e a tributação dos serviços prestados por cooperativas. Jornal JURID, Bauru, 29 abr. 2020. Disponível em: https://www.jornaljurid.com.br/doutrina/tributario/imposto-sobre-servicos-de-qualquer-natureza-issqn-e-a-tributacao-dos-servicos-prestados-por-cooperativas. Acesso em: 04 ago. 2021. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2017. ARANHA NETO, Waldemar de Albuquerque. Da incidência de ITBI nas cessões de direitos imobiliários. Curitiba: CRV, 2019. BELTRÃO, Irapuã. Curso de direito tributário. 5. ed. rev. e ampliada. São Paulo: Atlas, 2014. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 04 ago. 2021. BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 04 ago. 2021. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 04 ago. 2021 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (2. TURMA). Recurso Especial 1.754.011/CE. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ITBI. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. REGISTRO DE TRANSMISSÃO DO BEM IMÓVEL. BASE DE CÁLCULO.EFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. CONTRARIEDADE A DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXAME. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. MANDADO DE SEGURANÇA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. FUNDAMENTO NÃO ATACADO. SÚMULA 283/STF. ALÍNEA “C”. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. FALTA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL OBJETO DE INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. RECURSO DA DIAGONAL EMPREENDIMENTOS E ENGENHARIA E OUTROS1. A parte sustenta que o art. 1.022 do CPC/2015 foi violado, mas deixa de apontar, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Assevera apenas ter oposto Embargos de Declaração no Tribunal a quo, sem indicar as matérias sobre as quais deveria pronunciar-se a instância ordinária, nem demonstrar a relevância delas para o julgamento do feito (Súmula 284/STF). 2. A suscitada ofensa constitucional não merece conhecimento, porquanto o exame da violação de dispositivos constitucionais é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, do permissivo constitucional. 3. Ademais, os insurgentes restringem-se a alegar genericamente ofensa a dispositivos de lei federal sem, contudo, demonstrar de forma clara e fundamentada como o aresto recorrido teria violado a legislação federal apontada. Incide na espécie, por analogia, o princípio estabelecido na Súmula 284/STF. 4. A divergência jurisprudencial deve ser comprovada, cabendo a quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, com indicação da similitude fática e jurídica entre eles. Indispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos acórdãos recorrido e paradigma, realizando-se o cotejo analítico entre ambos, com o intuito de bem caracterizar a interpretação legal divergente. O desrespeito a esses requisitos legais e regimentais (art. 1.029, § 1º, do CPC/2015 e art. 255 do RI/STJ) impede o conhecimento do Recurso Especial com base na alínea “c” do inciso III do art. 105 da Constituição Federal. 5. A propositura do recurso pela via da divergência jurisprudencial não dispensa o recorrente de apontar qual o dispositivo legal que teria sido objeto de interpretação divergente entre tribunais. A deficiência na fundamentação obsta o conhecimento do recurso fundamentado na alínea “c”, razão pela qual incide a Súmula 284/STF. Precedentes do STJ. RECURSO DO MUNICÍPIO DE FORTALEZA 6. A parte recorrente sustenta que o art. 1.022 do CPC/2015 foi violado, mas deixa de apontar, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Apenas indica os dispositivos legais sobre os quais teria se omitido a Corte local; porém, deixa de tecer mais comentários sobre a tese jurídica, a ponto de permitir o entendimento da controvérsia e a relevância dela para o julgamento da demanda. Assim, é inviável o conhecimento do Recurso Especial nesse ponto, ante o óbice da Súmula 284/STF. 7. É inadmissível Recurso Especial quanto a questão que, a despeito da oposição de Embargos Declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal de origem. Incidência da Súmula 211/STJ. 8. Com relação à legitimidade passiva do Secretário de Finanças, o Tribunal de origem se manifestou nos seguintes termos (fl. 558, e-STJ): “Passo agora a analisar a questão trazida pelo apelante sobre a ilegitimidade passiva do Secretário de Finanças, uma vez que afirma que não é da competência do secretário de finanças o procedimento de cobrança, seja direto lançamento- ou indireto- utilização das medidas de exigibilidade. No entanto, entendo que a tese alegada pelo apelante não deve prosperar. Explico. No presente caso deve ser afastada a preliminar trazida pelo apelante em face da Teoria da Encampação, segundo a qual não se reconhece ilegitimidade da autoridade coatora se esta defende o mérito do ato coator (encampa), tendo em vista que a partir desta análise é possível visualizar o vínculo hierárquico com a autoridade que praticou o ato. Ademais, a indicação errônea da autoridade não é causa de extinção do processo quando não altera a competência para julgamento do mandado de segurança”. 9. Contudo, nas razões do Recurso Especial, não houve impugnação particularizada de fundamento basilar que ampara o acórdão hostilizado, ou seja, de que não se reconhece a ilegitimidade da autoridade apontada como coatora em virtude da Teoria da Encampação. Esbarra-se, pois, por analogia, no obstáculo da Súmula 283/STF, que assim dispõe: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.” 10. O Tribunal a quo foi claro ao dispor que o fato gerador do ITBI é o registro imobiliário da transmissão da propriedade do bem imóvel. A partir daí, portanto, é que incide o tributo em comento. 11. O fato gerador do imposto de transmissão (art. 35, I, do CTN) é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante registro do negócio jurídico no ofício competente. Precedentes do STJ. CONCLUSÃO 12. Recursos Especiais parcialmente conhecidos e, nessa parte, não providos. Relator: Min. Herman Benjamin, 17 de dezembro de 2019. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp. Acesso em: 26 jul. 2021. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 656. Brasília, DF, 24 de setembro de 2003. 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Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&queryString=itbi%20cessao%20direito&sort=_score&sortBy=desc. Acesso em: 06 ago. 2021. CARNEIRO, Cláudio. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015. CASTRO, Eduardo M. L. Rodrigues de; GOUVEIA, Marcus de Freitas; LUSTOZA, Helton Kramer. Tributos em Espécie. 4. ed. Salvador: Juspodivm, 2017. COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. HARADA, Kiyoshi. ITBI: doutrina e prática. 2. ed. rev., atual. e ampliada. São Paulo: Atlas, 2016. JOÃO PESSOA. Lei Complementar nº 53, de 23 de dezembro de 2008. Institui o Código Tributário Municipal e dá outras providências. João Pessoa, PB: Prefeitura Municipal de João Pessoa. MACHADO, Hugo de Brito; MACHADO, Schubert de Farias. Dicionário de direito tributário. São Paulo: Atlas, 2011. MACHADO, Hugo de Brito. 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