A compra e venda pode ter o preço definido por medida de extensão do imóvel (ad mensuram), em que as medidas são precisas e determinantes para o negócio, ou por corpo do imóvel (ad corpus), em que as medidas são imprecisas e meramente enunciativas, não sendo determinantes para o negócio. Tal característica deve ser ajustada a par da manifestação da vontade das partes no negócio jurídico. Não havendo menção expressa à modalidade, entende-se que, quando há a referência à área certa e determinada do imóvel, a compra e venda deve ser reputada como ad mensuram. Havendo referência à área inexata do imóvel, sendo meramente enunciativa, entende-se que a compra e venda deve ser reputada como ad corpus. Em preceito legal específico previsto no Código Civil, em seu artigo 500, quando é celebrada pela metragem precisa e especificada do imóvel — compra e venda como ad mensuram —, se as dimensões reais do imóvel não corresponderem com àquelas descritas em contrato, está-se diante de inadimplemento contratual do vendedor, em relação ao qual a legislação confere em prol do comprador o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço, ou, se em vez de falta houver excesso, é conferida à obrigação, à sua escolha, de completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso. Em se tratando de compra e venda ad corpus, no qual não se considera a exatidão das medidas do imóvel, inexiste inadimplemento contratual, se as dimensões reais do imóvel não corresponderem com àquelas descritas em contrato. Assinale-se que, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada do imóvel, o Código Civil impõe que a referência às dimensões foi meramente enunciativa a atrair a modalidade de compra e venda ad corpus. Quando não existe correspondência das medidas reais do imóvel com àquelas descritas em contrato de compra e venda ad mensuram, o vício deve ser considerado como aparente, por ser de fácil constatação mediante a medição das dimensões do imóvel, a partir do seu recebimento. A legislação não é uniforme em relação aos prazos para a reclamação do referido vício. O Código de Defesa do Consumidor, em seus artigos 26 e 27, estabelece que é de 90 dias o prazo para reclamar por vícios aparentes ou de fácil constatação, contado a partir da efetiva entrega do bem, e que a ação de reparação de danos deve ser ajuizada em até cinco anos. Por sua vez, o Código Civil, em seus artigos 500 e 501, prescreve que, em se tratando de compra e venda de imóvel ad mensuram, em que as medidas reais do imóvel não corresponderem com àquelas descritas no negócio, a ação deve ser ajuizada no prazo de um ano, contado do registro do contrato. A despeito das diversas regras legais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é ainda mais vacilante sobre a temática do prazo para a reclamação do referido vício, a saber: 1) na compra e venda ad mensuram, o legislador estabeleceu prazo decadencial de um ano, a par do artigo 501 do Código Civil, para reclamar contra a entrega de metragem inferior à contratada (AgInt no REsp 1.611.155/SP, relator ministro Paulo de Tarso Sanseverino); 2) decai em 90 dias o direito de o comprador reclamar da diferença entre a metragem do imóvel veiculada em propaganda e a área do apartamento descrita, e a pretensão de indenização pode ser ajuizada no prazo prescricional de cinco anos (REsp 1488239/PR, relator ministro Villas Bôas Cueva); 3) o prazo decadencial previsto no artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor relaciona-se ao período de que dispõe o consumidor para exigir em juízo alguma das alternativas que lhe são conferidas pelos artigos 18 e 20 (substituição do produto, a restituição da quantia paga, o abatimento proporcional do preço e a reexecução do serviço), não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má execução do contrato (REsp 189817/SP, relatora ministra Nancy Andrighi). Por oportuno, considerando a primazia constitucional do direito fundamental de proteção ao consumidor, e a previsão do princípio do diálogo das fontes, constante do Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 7, entende-se que o Direito do Consumidor pode ter mais de uma fonte legislativa, sendo considerada uma codificação aberta a atrair também a aplicação de outras regras legais que possam beneficiar o consumidor. A par do princípio do diálogo das fontes, o Código de Defesa do Consumidor é uma codificação permeável, não exaustiva, eis que o seu artigo 7º remete à aplicação da norma mais favorável ao consumidor, estando ela no próprio código ou em outra lei geral, lei especial ou tratado do sistema de Direito brasileiro (Cláudia Lima Marques e outros. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT, 2003, página 185). Em outros termos, o princípio do diálogo das fontes aponta que, no campo da proteção do consumidor, deve ser aplicável a norma mais favorável, ainda que se afaste da regra da especialidade, eis que o mandamento de proteção do consumidor deve ser cumprido por todo o sistema jurídico, em diálogo das fontes, e não somente por intermédio do Código de Defesa do Consumidor (REsp 1009591-RS, relatora ministra Nancy Andrighi). A propósito, em caso de responsabilidade contratual o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o prazo prescricional para o ajuizamento de ação é, em regra, de dez anos, a par do artigo 205 do Código Civil, salvo a previsão de regra específica em contrário (EREsp 1.280.825/RJ, relatora ministro Nancy Andrighi). Existindo, entretanto, regra especial em sentido contrário, não deve ser aplicado o prazo decenal previsto no artigo 205 do Código Civil (AgInt no REsp 1745193/RS, relator ministro Luis Felipe Salomão). Por conseguinte, em razão do critério da especialidade, isto é, existindo regra legal específica no Código Civil, em seu artigos 500 e 501, que trata do prazo para reclamar em juízo da diferença da metragem do imóvel em compra e venda ad mensuram, e por se tratar de regra mais benéfica ao consumidor do que aquela prevista no artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor, afigura-se que deve ser aplicável o prazo decadencial de um ano — ao invés dos 90 dias previstos no Código de Defesa do Consumidor — para pleitear a reparação de danos consubstanciada no direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço. Fonte: Consultor Jurídico