Em finanças, swap (em português, permuta) é uma operação em que há troca de posições quanto ao risco e à rentabilidade, entre investidores. O contrato de swap no mercado financeiro pode ter como objeto, commodities, ativos financeiros ou moedas. Muito mais abrangente que o objeto deste artigo, as operações Barter. A operação de barter, vai além da simples permuta, pois é conhecida no Brasil como uma negociação realizada entre produtores rurais e empresas de insumo, ou cooperativas de crédito rural. O que se faz, comumente, é o pagamento dos insumos com o produto a ser futuramente colhido pela propriedade rural. Via de regra não há intermediação monetária e o acordo é realizado no momento de o produtor receber o insumo, mas pode se dar até antes da colheita, e o um dos meios do credor se resguardar será pela emissão pelo devedor da Cédula de Produto Rural (CPR). Essa operação é utilizada no Brasil desde 1990 com a publicação da lei 8.929/90 e ganhou força a partir do ano de 2001 com a possibilidade de se realizar ainda a Cédula de Produto Rural Financeira, com modificação da lei 8.929/94 pela lei 10.200/2001. Logo, ela garante ao agricultor a compra por insumos, sem que haja a necessidade de tirar dinheiro do bolso. A operação barter, entretanto, não se trata de uma simples negociação de troca ou escambo, como as práticas tradicionais de mercado, uma vez que nas operações barter, estas têm liquidação financeira diretamente pela parte interessada nos produtos agropecuários (offtaker – cooperativas, traders, indústrias processadoras de alimentos, etc.) e que esteja com seu preço fixado, ou preço mínimo, típico das operações hedge. O hedge é uma opção que mitiga riscos, mas não será objeto deste paper1. As operações Barter, em agronegócio, significa o pagamento pelo insumo através da entrega do grão na pós-colheita, ou mesmo produto agropecuário, sem a intermediação monetária, servindo como eficiente mecanismo de financiamento de safra. Ou seja, a troca de insumos, como fertilizantes, sementes, defensivos, entre outros, por produtos agropecuários, como cana, açúcar, soja, milho, algodão, sorgo, aveia, café, e demais após a colheita. Não é comum, mas até mesmo arrobas de boi podem ser objeto da operação barter. O serviço de barter é oferecido no Brasil por diversas companhias e entre estas pode-se exemplificar a Bayer, Monsanto, Cargill e Bunge, que financiam o produtor em troca dos grãos que serão colhidos mais tarde. As operações Barter e os riscos no agronegócio Qualquer atividade econômica envolve riscos, as operações barter, inclusive. Em tempo de pandemia, mais ainda2. Convém analisar o que seria o risco para o agronegócio e as operações barter. O risco em si, é evento natural do capitalismo e está associado à probabilidade de fracasso de um dado evento. Alguns fatores de risco para o agronegócio são: as crises políticas e econômicas internas; os problemas de ordem sanitária ou ambiental; o clima; a economia mundial, demanda por alimentos, câmbio e retração do mercado (vide a atual situação com a pandemia Covid-19) e as relações familiares e impactos na gestão do negócio. Pode-se classificar ainda os riscos em naturais, mercadológicos, financeiros e pessoais. Os riscos naturais, podem ser: a) tecnológicos, como a defasagem tecnológica, dificuldade de acesso à tecnologia, desconhecimento, etc.; b) climáticos como ocorrência de granizo, excesso de chuva, seca, vendavais, temperaturas inadequadas à produção; c) biológicos locais, como a ocorrência de pragas, doenças, cultivares inadequados, etc.; d) biológicos extrínsecos, como a ocorrência de uma pandemia, impensável há poucos meses. Os riscos mercadológicos podem ser exemplificados como, a) mudança de hábitos do consumidor; b) variação do preço do produto dentro do ciclo biológico; c) Inflexibilidade do negócio, pela dificuldade em mudar de atividade em momentos de crise; d) dificuldades na exportação por diversos motivos. Os principais riscos financeiros são: a) dívidas muito elevadas do produtor que proporcionaria maior risco financeiro; b) juros altos; c) consumo e investimento, se o produtor rural gastar todo o dinheiro em consumo e nada em investimento/poupança, o seu futuro estará em risco, em caso de frustrações totais ou parciais de safra, isto é não deixa margem para eventual risco financeiro. Já os riscos pessoais são mais difíceis de serem previstos, pois é uma questão de confiança do credor, só se sabe sobre ele conhecendo bem o produtor, sua família e sua estrutura produtiva. Estes riscos podem ser de saúde (doença e acidentes pessoais do produtor, familiares ou colaboradores); de quebra de situação familiar, como brigas internas de família, separação ou divórcio; fim de sociedade; e alteração do objetivo do negócio. Dentre estes riscos, pode-se citar ainda a falta de conhecimento do que se pretende praticar, e aventurar-se em plantio de grãos desconhecidos, por exemplo, poderá aumentar o risco pois pode não conhecer a atividade; ter dificuldade de acesso às informações; não se adequar à nova atividade, e basear-se em processos produtivos de outra lavoura, por exemplo, ou outra criação de animais e tentar transpor a mesma experiência da produção anterior e esta ser totalmente inadequada. Minimizando riscos da operação Barter e lastreadas em títulos de crédito. Os títulos de crédito utilizáveis para garantir as operações barter normalmente são a Cédula de Produto Rural (CPR)3, o Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA)4, a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e o Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), os três últimos títulos de crédito, trazidos pela lei 11.076/2004. Por certo que outros títulos de crédito ou mesmo contratos agrários poderão garantir tal operação, como uma permuta por instrumento particular ou mesmo escritura pública de bens agrários, dentre outros, mas este paper abordará apenas as Cédulas de Produto Rural. O conceito de título de crédito formulado por Cesare Vivante, “título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele mencionado” dá a exata noção do instituto. Dessa definição defluem três requisitos mínimos, como a literalidade, a autonomia e a cartularidade. A literalidade é o princípio segundo o qual somente produzem efeitos jurídico cambiais os atos lançados no próprio título de crédito. Já a uma concepção de autonomia nos títulos de crédito, tem-se que cada obrigação que deriva do título é autônoma em relação às demais, de modo que os vícios que comprometem a validade de uma relação jurídica documentada no título, não se estendem às demais relações abrangidas no mesmo documento. A cartularidade é princípio, segundo a qual o exercício dos direitos representados pelo título de crédito pressupõe direito ao possuidor de exercê-lo, pois o tem em sua posse. Outro princípio (ou sub-princípio) é o da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé. Por este, o executado em virtude de um título de crédito não pode alegar, em seus embargos, matéria de defesa estranha à sua relação direta com o exequente, salvo se comprovada má-fé deste. Visto pequeno introito sobre os títulos de crédito, será necessário estudar a Cédula de Produto Rural. A Cédula de Produto Rural (CPR) O objeto de análise neste ponto do trabalho são os títulos cambiariformes, especificamente as cédulas que incorporam créditos destinados às atividades rurais, industriais, comerciais e bancárias, cuja ordem na exposição, atende apenas à cronologia acerca do surgimento de tais cédulas no direito positivo nacional. As rurais, como as Cédulas de Produto Rural (CPR) será o corte epistemológico para analisar as operações de barter. Para Rubens Requião5, os títulos cambiários são melhores classificados, para fins didáticos, com relação à sua natureza e, portanto: Classificam-se em abstratos e causais. Os títulos abstratos são os mais perfeitos como títulos de crédito, pois deles não se indaga a origem. Vale o crédito que na cártula foi escrito. Títulos causais são aqueles que estão vinculados, como um cordão umbilical, à sua origem. Como tais, são imperfeitos ou impróprios. São considerados títulos de crédito pois são suscetíveis de circulação por endosso, e levam neles corporificada a obrigação. A duplicata, os conhecimentos de transporte, as ações, são deles exemplo. Entre os títulos causais ou impróprios podemos distinguir os que constituem comprovante de legitimação do credor, e são geralmente declarados intransferíveis – bilhetes, passagens, cadernetas de Caixa Econômica, vales e tíquetes e outros que são títulos de legitimação, que são direitos transferíveis, tais como vales postais, cautelas de penhor ao portador. Enquanto nos comprovantes de legitimação o possuidor se legitima como contraente originário, nos títulos de legitimação quem for possuidor legitima-se como cessionário eventual. O título nesse caso é probatório e prova o contrato. O primeiro opera em favor do devedor; o segundo, título de legitimação, opera em favor de ambos, devedor e credor (Ascarelli). Entre os títulos causais ou impróprios poderíamos incluir um grupo de títulos chamados representativos, nos quais a circulação importa a transferência da mercadoria a que se referem: conhecimento de transporte ferroviário ou marítimo, warrant e conhecimento de depósito, expedidos pelos armazéns gerais. As cédulas de crédito, nesta classificação são ditas como títulos cambiariformes causais. A Cédula de Produto Rural, portanto, é um título de crédito cambiariforme. Instituída pela lei 8.929/1994, a Cédula de Produto Rural (CPR) é um título de crédito representativo da promessa de entrega de produto rural, com ou sem garantia cedularmente constituída6. Se não for constituída a garantia, será chamada de Nota de Produto Rural. A lei 8.929/1994 prevê que as operações podem ser constituídas com garantias reais, como o penhor rural7, a hipoteca8 e a alienação fiduciária em garantia de bens móveis ou imóveis9. O emitente cedular, em tese, poderia dispor dos elementos do título, desde que nele constem os requisitos essenciais estabelecidos pela Lei da Cédula de Produto Rural e principalmente nas normativas infra legais do BACEN. Doutrinariamente, considera-se a existência de duas modalidades de CPR, a física, e a financeira10. O registro das garantias das Cédulas de Produto Rural Com a redação da lei 13.986/2020, sua constituição após 01 de janeiro de 2021 para ter validade e eficácia, deverá ser registrada ou depositada, em até 10 (dez) dias úteis da data de emissão ou aditamento, em entidade autorizada pelo Banco Central do Brasil a exercer a atividade de registro ou de depósito centralizado de ativos financeiros ou de valores mobiliários11. Entretanto não retirou a publicidade do registro das garantias reais, ao estipular, no parágrafo primeiro do artigo 12 da Lei, que a constituição de qualquer garantia real será realizada junto as serventias registrais imobiliárias onde estiverem localizados os bens dados em garantia. Na sequência, o parágrafo 2º atecnicamente diz que: A validade e eficácia da CPR não dependem de registro em cartório, que fica dispensado, mas as garantias reais a ela vinculadas ficam sujeitas, para valer contra terceiros, à averbação no cartório de registro de imóveis em que estiverem localizados os bens dados em garantia, devendo ser efetuada no prazo de 3 (três) dias úteis, contado da apresentação do título ou certidão de inteiro teor, sob pena de responsabilidade funcional do oficial encarregado de promover os atos necessários (grifo nosso). Ressalta-se o prazo de deposito em dez (10) dias úteis em entidade autorizada pelo Banco Central do Brasil a exercer a atividade de registro ou de depósito centralizado de ativos financeiros, que realizará mero depósito, sem qualificação registral, apenas digitalizará, digitará ou será transmitido eletronicamente os dados do título. Já perante os registros imobiliários e de títulos e documentos, que exercem qualificação registral12-13 o prazo é mais curto, ou seja, três (3) dias, invertendo a lógica temporal em face a complexidade da execução de cada mister. E em caso de bem móvel, o parágrafo 4º comete o mesmo equívoco e diz, novamente, que a CPR será “averbada” na Serventia Registral de Títulos e Documentos do domicilio do emitente. A Cédula de Produto Rural conceitualmente é tida como um título líquido e certo, exigível pela quantidade e qualidade de produto nela previsto, que pode ser emitido por produtor rural, cooperativa ou outra associação de produtores rurais. A doutrina a classifica como um título de crédito livre, mas a regulação deste título engessa sua emissão, pois o Banco Central regula de tal forma que diríamos que é de emissão “quase vinculada”. As inúmeras resoluções do Banco Central do Brasil são um emaranhado de atos normativos, que ao examinar algumas delas deixa a desejar a clareza com que trata determinados assuntos, como a seguir: 20 – A eficácia das garantias reais contra terceiros depende de registro nos cartórios ou órgãos competentes. (Res 3.239). 21 – Não se registra o penhor cedular, cuja eficácia contra terceiros nasce com a inscrição da cédula no cartório competente. (Res 3.239)14. O item 20 da resolução do BACEN está de acordo com o sistema legal, isto é, Código Civil de 2002 e Lei de Registros Públicos. Já o item 21, daria ao leigo margem interpretativa totalmente errônea, vez que o penhor cedular, normalmente rural como penhor especial que é, necessita de seu registro para sua validade e eficácia erga omnes no Livro 3 da Serventia Registral competente15. O próprio parágrafo 2º do artigo 12 da lei 8.929/1994 prevê, como dito antes, sem técnica jurídica, a averbação do penhor. Confusas as disposições desta resolução. Do texto legal, com a redação da lei 13.986/2020 percebe-se que o mecanismo da cédula de produto rural foi profundamente alterado pela nova legislação. Como previamente estudado, deduz-se que, apesar da lei 13.986/2020 ter alterado o texto legal das Cédulas de Produto Rural, os registros das garantias reais serão feitos na Comarca (ou Circunscrição) Registral Imobiliária respectiva. Permanecem intactas as disposições referentes ao registro imobiliário das garantias, pois, mesmo que a CPR seja depositada em entidade autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil, as garantias reais, para sua oponibilidade erga omnes, faz-se necessária. *Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Especializado em Direito Civil e Processo Civil pela UES. Mestre em Direito pela EPD – Escola Paulista de Direito. Professor da graduação e da pós-graduação de Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios. Atual diretor de assuntos Agrários do IRIB. Autor de diversas obras em coautoria sobre temas registrais. Fonte: Migalhas