A possibilidade de alteração de nome não é novidade. A Lei dos Registros Públicos de 1973 já trazia a previsão de, nos casos em que o nome fizesse a pessoa passar por situações vexatórias, se poder requerer a alteração, expondo suas razões em um processo judicial e, após audiência com o Ministério Público, o Juiz poderia ordenar a alteração por sentença.
No entanto, não havia previsão para pessoas transexuais ou travestis que desejassem a alteração para um nome do sexo oposto, de modo que mesmo com a previsão da Lei dos Registros Públicos para possibilidade de alteração de nomes que causassem constrangimento, muitos viam seus pedidos negados pelos juízes. Porém, na ultima década a jurisprudência passou por grandes transformações e evoluiu muito nesse sentido.
No início, muitos juízes entendiam que para conceder a alteração de nome, era necessário que a pessoa tivesse passado pela cirurgia de transgenitalização. Mas esse entendimento foi perdendo força e em 2014, durante a I Jornada de Direito da Saúde, o Conselho Nacional de Justiça publicou os enunciados 42 e 43, dispondo que ficando comprovado o desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto, era dispensável a realização de cirurgia.
Em 2016, o Decreto nº 8.727/2016 positivou o direito de pessoas travestis e transexuais a incluírem o nome social, ou seja, o nome pela qual a pessoa é reconhecida socialmente, em documentos oficiais, mas ainda com algumas ressalvas, como o acompanhamento do nome civil em atendimento do interesse público e à salvaguarda de direitos de terceiros.
No ano seguinte, em 09 de maio de 2017, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial nº 1626739/RS, demonstrando um grande avanço do entendimento jurisprudencial sobre o tema, dando mais importância para o interesse individual, afirmando que o registro civil deve retratar a identidade de gênero psicossocial da pessoa e não a realidade biológica, de modo que não se poderia exigir a realização da cirurgia de transgenitalização para que sejam alterados tanto o nome quando o gênero.
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, julgou em março deste ano de 2018 a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4275, e foi ainda mais adiante, além de reconhecer o direito da alteração do nome e sexo independente de cirurgia, afirmou que para tanto bastava a solicitação diretamente no Cartório de Registro Civil, sem necessidade de ação judicial.
Assim, em junho deste mesmo ano, o Conselho Nacional de Justiça publicou o Provimento nº 73, regulamentando a forma administrativa da alteração de nome e gênero no Registro Civil, especificando que a pessoa maior de 18 anos, de posse dos documentos elencados no art. 4º do provimento, poderá requerer diretamente no cartório, independente de autorização judicial, de realização de cirurgia ou mesmo de apresentação de laudo psicológico, a alteração do gênero e do nome, não podendo, no entanto, alterar o sobrenome.
O provimento do CNJ avançou ainda mais, prevendo que o ato de alteração deve ser sigiloso, de modo que, com exceção dos documentos que ficarão arquivados no cartório, nos demais documentos como Certidão de Nascimento, RG, CPF ou CNH, não constarão qualquer informação a respeito da alteração ou do gênero ou nome anterior, mas apenas o novo nome e gênero escolhidos.
Este mesmo entendimento foi confirmado pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2018, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 670422, no qual o Tribunal concluiu que, não apenas é possível o pedido administrativo da alteração de nome e gênero sem qualquer exigência além da manifestação de vontade do indivíduo, mas que, ainda, não poderá constar nas certidões do registro ou dos documentos públicos qualquer observação sobre a origem do ato.
Fonte: Jornal do Oeste